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TRIBUNAL DO JÚRI: GARANTIA DA SOCIEDADE OU DO RÉU?

  • Por MARLON RICARDO
  • 20 jul., 2017
Marlon Ricardo Lima Chaves
     O Tribunal do Júri tem competência, conforme definido na Constituição Federal, para julgar aqueles crimes que agridem um dos bens jurídicos mais importantes, a vida humana.
     Em consequência, com a grande valoração dada pelo legislador à vida do homem, nada mais justo que as mais severas reprimendas cominadas na legislação penal recaiam sobre aquele que tenha praticado um delito doloso contra o bem jurídico vida humana.
Estes crimes são os que causam maior perplexidade e temor na sociedade, evidenciando, uma vez mais, a necessidade de serem apenados de forma muito severa.
     Destarte, imprescindível se faz que tais delitos sejam apurados e processados com prudência, assegurando-se efetiva possibilidade de defesa do acusado, por meio da integral aplicação dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, o que só um procedimento detido como o Tribunal do Júri pode proporcionar de forma absoluta.
     Ademais, estudos revelam que o Brasil ocupa as primeiras posições entre os países com maior índice de violência e criminalidade, com uma absurda média de mortes, demonstrando, dessa forma, a total insegurança em que vive a maioria da população brasileira.
     O Tribunal do Júri, ao possibilitar que os membros de notória idoneidade da sociedade julguem os delinquentes que tenham praticado um delito doloso contra a vida, tentado ou consumado, consoante o art. 436, do Código de Processo Penal , está minimizando o sentimento de injustiça que impera sobre a sociedade vítima de tais selvagerias.
     Tendo nascido, na forma como hoje se apresenta, possivelmente na Inglaterra do Século XII, significando um brado contra a opressão do monarca e fazendo com que o poder estatal fosse gradualmente diminuído, trata-se de um tribunal de conotação nitidamente democrática.          
     Malgrado, no início, tenha beneficiado somente os nobres, porque o julgamento pelos seus pares representava o julgamento da nobreza pelos seus semelhantes e não pelo povo, o certo é que permitiu, com o passar do tempo, a certeza de que o homem deveria julgar o homem, democratizando o conceito de aplicação da justiça. Tanto assim que foi transportado para os Estados Unidos da América e passou a figurar dentre as garantias fundamentais do homem na constituição, in verbis

5ª. Emenda: Ninguém será obrigado a responder por crime capital, ou por outro crime infame, a não ser perante denúncia ou acusação em um grande júri (...).
6ª. Emenda: Em todos os processos criminais, o acusado usufruirá do direito a um julgamento rápido e público, por um júri imparcial do estado e distrito onde o crime tiver sido cometido (...).

     Vislumbra-se, assim, que desde seus primórdios, a principal característica do Tribunal do Júri é a sua conotação democrática, posto que a participação do povo faz com que um sistema criminal extremamente positivista, muitas vezes insensível a dinâmica social e a seus apelos, se aproxime da realidade histórica a que deve corresponder, possibilitando julgamentos que, antes de simplesmente demonstrarem o desejo da lei, promovem a mais lidima aplicação da justiça.
     A parcela democrática do júri, está caracterizada pelo fato dos representantes da sociedade poderem participar do julgamento do acusado, emitindo os seus veredictos e influindo no resultado final do julgamento, excepcionando, assim a regra segundo a qual, somente aos integrantes do Poder Judiciário, está conferido o poder de julgar o meritum causae.
Portanto, o júri representa uma garantia à sociedade de poder julgar o indivíduo que praticou o mais reprovável dos crimes, que é a agressão dolosa da vida de um ser humano.
     Caso houvesse a possibilidade de privação desse direito, permitindo-se ao acusado a escolha de seu julgamento pelo juiz de direito, em procedimento totalmente diverso do júri, ocorreria uma grande afronta ao direito da sociedade, que tem garantido constitucionalmente a prerrogativa de participar do julgamento dos delinquentes que cometeram crimes dolosos contra a vida.
     Insta salientar, ainda, que há estudos revelando que mesmo aqueles que poderiam ser beneficiados pelo direito de escolha não mudariam a competência do julgamento para os crimes dolosos atentatórios à vida do ser humano. Diante disso, é cabível a seguinte indagação: por qual motivo estes criminosos continuam preferindo o procedimento do júri para julgá-los ao invés de um procedimento ordinário, perante o juiz de direito?
     Ao nosso ver, seriam estes os principais fundamentos:

a) acreditam que os jurados, por serem cidadãos comuns e não terem profundo conhecimento das leis, conseguem aplicar mais corretamente a justiça ao fazerem o uso apenas do bom senso, deixando de lado a técnica utilizada pelos magistrados.
b) estudos revelam que dentre todos os delitos previstos em nossa legislação, os dolosos contra a vida são os que estão mais propensos se serem cometidos por qualquer homo médium, em decorrência da notória falta de autocontrole dos seres humanos quando se veem perante situações difíceis ou desesperadoras, especialmente se estiverem tomados pelo sentimento de fúria ou ira. Face a essa constatação, creem os sentenciados que ao serem julgados por seus pares, estes serão mais complacentes do que o juiz de direito, porto que farão uso de sua noção de justiça aliada a compaixão;
c) não se sentiram injustiçados com as penas que lhe foram impostas pelo Conselho de Sentença. Assim, acham que o julgamento dos jurados é mais eficaz do que o proferido pelo juiz togado, razão pela qual não veem necessidade de se transferir a competência do órgão decisor.
d) acreditam que, por tratar-se de um julgamento por pessoas desconhecedoras da legislação, estas são mais suscetíveis a argumentação teatral que é possibilitada em plenário, fazendo com que as decisões sejam dirigidas segundo a capacidade argumentativa do defensor e não quanto ao fato praticado em si.

     Portanto, o fato do júri ser composto por homens leigos, menos distantes das mudanças ocorridas na sociedade e, logo, mais aptos a fazer com que a lei se adapte aos caso concreto e não que a realidade se adeque a norma, representa uma segurança para aqueles que serão submetidos a julgamento, visto que o juiz togado seria menos afeito a essa adaptação e mais rígido em suas decisões, tornando-se, dessa forma, mais distante do povo.
     Além disso, sem encastelamento das técnicas e no saber jurídico, o jurado, pessoa extraída do povo, tem mais condições de realizar justiça, uma vez que penetra em considerações morais, éticas, psicológicas, econômicas, entre outras, que também fazem parte da vida humana e vão além da aplicação pura e fria da lei, id est, não faz um julgamento tão limitado como o magistrado, posto que da importância a inúmeros outros fatores aliados às leis.
     Nota-se, assim, que ninguém poderá dizer que o juiz de Direito conhece melhor as emoções do ser humano do que o jurado. Daí por que não é verdadeiro o argumento de o conhecimento técnico fornecer ao julgador bom senso e prudência.
Contudo, urge mencionar que o simples fato da maioria dos pretensos beneficiários do direito de escolha continuarem a preferir o julgamento perante o Tribunal do Júri não é capaz de, por si só, dar guarida a assertiva de que tal direito (de opção) lhes devem ser suprimido. Ao contrário, o que da sustentação para que o Júri continue como juízo competente para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida é o fato de que o mesmo é estabelecido, primeiramente, em favor da sociedade e, secundariamente, em favor do acusado.
Deveras, muito mais que uma garantia ao agente que praticou um delito doloso contra a vida, a Instituição do Júri represente um direito a toda a sociedade que foi vítima de tal delito para ver o criminoso julgado por seus pares, comprovando, dessa forma, que a mesma foi instituída pro societate e não pro reo.
     Vê-se, pois, que em hipótese alguma o Tribunal do Júri pode ser considerado como uma garantia direta ao direito de liberdade, pois essa conotação lhe iria conferir o errôneo caráter de órgão protetor do agente acusado da prática de um delito. Não foi o júri idealizado para servir aos acusados da prática de crimes, mas para atribuir ao indivíduo um julgamento justo e imparcial, de forma que a garantia é ao devido processo legal e não ao acusado.
     Neste sentido, é a lição de NUCCI:

(...) o júri não é uma garantia do réu, mas de toda a sociedade, pois, em última análise, faz parte do devido processo legal.
(...) Assim, como a ampla defesa e o contraditório constituem a garantia ao devido processo legal, porque são seus corolários, o júri ocupa o mesmo espaço. É o “devido processo legal” estabelecido para os acusados da prática de crimes dolosos contra a vida.

     Indiretamente, termina protegendo a liberdade, pois a única forma de se enviar ao cárcere quem tenha cometido um delito doloso contra a vida é através do julgamento pelo júri, que é o processo regular e constitucionalmente estabelecido para tanto. Isso não significa que o Tribunal do Júri sirva exclusivamente ao réu (e sua liberdade), pois muitas garantias têm a finalidade de proteger o indivíduo e a sociedade contra abusos do Estado.
     Desde o momento em que foi utilizado como garantia fundamental, visando aos julgamentos imparciais e independentes, teve por fim assegurar o devido processo legal e não simplesmente a liberdade de quem é acusado. Justificar a existência do tribunal popular como defensor estrênuo da liberdade do réu é fomentar o errôneo prisma de que é parcial e fonte geradora de impunidade. Trata-se de um tribunal formado pelo povo, para julgar seus pares, seja condenando, seja absolvendo.
     Por isso, não é garantia direta de liberdade de ninguém, mas constitui um corolário do devido processo legal. Aliás, também o devido processo legal não está a serviço do réu, mas da sociedade. Como garantia fundamental, serve de escudo a prepotência e ao abuso estatal, mas não de antídoto contra a punição justa.

     Por consequência, se for dado ao réu o direito de optar por ser julgado pelo juiz de direito ao invés do Tribunal Popular, estará havendo uma clarividente infração a uma garantia que foi confiada a sociedade pela Carta Magna.
     Em assim sendo, face a demonstração inequívoca de que o Júri é uma instituição concebida em benefício da sociedade e não do acusado, está patente que este último não poderá ser julgado por outro juízo que não seja o Tribunal do Júri.
     Outrossim, cumpre consignar que pode ser o Júri previsto expressamente dentre os direitos individuais, garantindo o cumprimento do devido processo legal, e por ser instituído primordialmente em benefício da sociedade, não há dúvidas de que o mesmo não pode ter sua competência e constituição modificada pelo direito de escolha do acusado, eis que constitui-se em uma cláusula pétrea, conforme preconiza o art. 60, §4º, inciso IV, da Constituição Federal.
Importante destacar, que se a sociedade fosse ficar a mercê da decisão do Réu para saber quem seria o juízo competente para julgá-lo por ter praticado um crime doloso contra a vida, estar-se-ia colocando sub judice seguranças jurídicas e a eficácia do Estado Democrático de Direito.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

BARBOSA, Ruy. Comentários à Constituição Federal Brasileira, coligidos e ordenados por Homero Pires, São Paulo, Saraiva, 1934.
GRECO FILHO, Vicente. Tutela Constitucional das Liberdades. São Paulo. Saraiva. 1989.
NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. 3ª Ed. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais. 2012.
NUCCI, Guilherme de Souza. Júri – Princípios Constitucionais. São Paulo. Juarez de Oliveira. 1999.
TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro. São Paulo. Saraiva. 1983.
TULVENCHLAK, James. Tribunal do Júri – contradições e soluções. 5ª ed. São Paulo. Saraiva 1997.
U.S.A, Constituition, Admendment V e VI (1791).
Por MARLON RICARDO 05 out., 2017
Apesar de avançar diariamente em nível de tecnologia, a medicina ainda é uma profissão eminentemente envolta de riscos, por este motivo, os tribunais têm sido abarrotados de conflitos envolvendo esta profissão.

Um dos motivos que mais tem causado discussões no meio jurídico é o “erro médico”, assim como sua responsabilização na esfera penal.

De início, devemos separa a figura do “erro médico” do simples descontentamento do paciente com o resultado do procedimento. A medicina é uma atividade meio, logo, o resultado almejado não depende apenas da atuação do médico, mas de fatores externos como a própria participação do paciente nos cuidados pós-operatórios.

Para que algo seja considerado “erro médico”, deve haver a desídia do profissional, não sendo possível sua caracterização se o profissional empregou todos os recursos disponíveis, ou se ocorreu um acidente imprevisível.

Tal erro, pode gerar diversas responsabilizações: na esfera administrativa, com a punição pelo Conselho Federal de Medicina; na esfera cível, com indenizações; e na esfera penal, com a possibilidade de prisão do profissional.

Na esfera criminal, para que se possa responsabilizar um médico, são necessários, principalmente, dois elementos. O primeiro, é que a consequência do erro seja prevista como crime (a morte, por exemplo, prevista no art. 121 do Código Penal). O segundo, é que o profissional tenha causado o resultado por dolo (consciência e vontade), ou por culpa (imprudência, negligência ou imperícia).

Para evitar o erro e a responsabilização criminal, cabe ao médico manter-se atualizado quanto aos procedimentos, principalmente com a realização de cursos certificados já que tais documentos podem ser usados como prova e inibirem o elemento da imperícia.

Também é recomendável fazer um briefing antes de cada procedimento, tanto com o paciente para que o mesmo compreenda os riscos, quanto com sua equipe. Após o procedimento, fazer uma conferência de materiais e de se foram realizadas todas as etapas necessárias, evita a responsabilização por negligência.

Para que não haja a imprudência é recomendado que o profissional opere descasado e sem pressa, já que uma cirurgia realizada em tempo muito curto, fora da normalidade, pode levar um julgador a entender que não foram tomados os cuidados necessários.

Tais cuidados ajudam, mas são genéricos. Alguns procedimentos dependem da tomada de mais precauções, para tanto, é fundamental que o médico tenha a consultoria de um advogado especializado de sua confiança.
Por MARLON RICARDO 20 jul., 2017

Marlon Ricardo Lima Chaves

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